quarta-feira, 18 de setembro de 2013

EM HOMENAGEM A URBANO TAVARES RODRIGUES (06/12/1923 - 09/08/2013)



     
        Por vezes o tempo dilui-nos, engole-nos numa pressa e, apesar do querer, ficam as palavras silenciadas, fora de tempo, por dizer.
        Um pedido de desculpa sincero à minha amiga, Isabel Fraga, pelas palavras tardias. As minhas sentidas condolências pela perda inestimável de seu pai, o Grande Escritor Urbano Tavares Rodrigues.
        A Cultura deste pequeno Grande país ficou mais pobre. Perante o findar da vida, que a todos é transversal,
o Escritor deixa uma vasta Obra publicada, onde espelha, claramente, o seu posicionamento contra os regimes totalitários que o conduziriam, numa luta consciente, à prisão em Caxias, durante a vigência da Ditadura de Salazar, e a um longo exílio, em França, até ao seu regresso após o 25 de Abril de 1974. A sua ousadia e frontalidade, valeram-lhe o impedimento de trabalhar, como professor, durante o Estado Novo. Ainda muito jovem, Urbano Tavares Rodrigues, atento e observador do que o rodeava, apercebeu-se das diferenças sociais, nomeadamente, da desigualdade e diferença de tratamento da classe trabalhadora mais humilde. À medida que foi crescendo, desenvolveu-se nele uma consciência e preocupação cada vez maiores, que o levariam a uma profunda reflexão da sociedade na qual estava inserido e a posicionar-se, ideologicamente, à esquerda. A sua convicção assentava numa esquerda humanizada e visionária de como deve ser e viver uma sociedade, cujo bem-estar de cada cidadão é essencial e este critério deveria ser uma das preocupações dos Governos. Infelizmente, e não obstante todo o desenvolvimento tecnológico, as sociedades caminham para o seu inverso, num afunilamento cada vez mais visível, entre os direitos e deveres dos cidadãos, acentuando-se as desigualdades sociais, com a implementação de políticas desastrosas, e criando um fosso, cada vez maior, entre os muito ricos e os muito pobres.
        Urbano Tavares Rodrigues viveu o bastante para alertar, através da sua Obra, para essa falta de humanismo, de tolerância e de preocupação social, afecta aos Governos de cariz neo-liberal.  É impossível dissociar do Homem e do Escritor a sua imensa generosidade e humanismo. Sempre fiel às suas convicções ideológicas, qualquer adjectivação pecará por ser insuficiente face à grandeza e dimensão humanas, que caracterizaram este Grande Senhor da Literatura. Direi mesmo que Urbano Tavares Rodrigues é a sua Obra. Mais uma vez, num acto reiterado que me reporta a um passado recente, acontecido com o nosso Prémio Nobel da Literatura, José Saramago, penso que o Governo se "esqueceu" de prestar a devida e merecida homenagem ao Escritor, Jornalista, Ensaísta, Crítico Literário e Professor de Literatura. Sabem-se, sobejamente, os motivos... É lamentável verificar a enorme incapacidade latente nos Governos de Direita, como o Governo que actualmente governa Portugal, em lidar com a frontalidade de quem se posiciona à esquerda. Acima de qualquer ideologia, deveria estar o saber reconhecer e enaltecer as qualidades de um indivíduo, quer ele seja Artista Plástico, Músico, Actor ou Escritor.
        A Cultura incomodou sempre os Governos Ditatoriais, como este que nos governa, actualmente. Estes parecem não querer entender, num acto de pura conveniência, que a Cultura é o alimento espiritual de um Povo. Um Povo inculto é como se vivesse privado da luz. É facilmente manipulado e vive na ausência de um espírito crítico. A crítica é, indubitavelmente, o motor essencial e impulsionador do progresso, quer individual quer colectivo. Na ausência da informação e da formação, qualquer Sociedade regride e escraviza-se. É preciso que o diálogo e a reflexão se façam. Governos de índole ditatorial, ainda que se vistam de roupagens a aparentar uma postura democrática, enfermam por uma espécie de "complexo de inferioridade", usando e abusando de poderes que não lhes foram conferidos, aquando da sua eleição, para, a todo o custo, implementarem medidas anti-sociais, baseando-se em critérios falaciosos, numa politiquice, desculpem-me a crueza do termo, de meia-tigela, manipulando, ardilosamente, mas sem engenho nem arte, e procurando fazer crer que toda a acção empreendida é necessária para um bem-estar colectivo.
        Urbano Tavares Rodrigues naturalmente com grande sentido de oportunidade, elevação e humildade, revela qualidades de grande humanista e aborda, em parte da sua Obra, a temática, incómoda, dos podres de uma Sociedade regida por lobbies, corrupção e manipulação, com consequências nefastas para os cidadãos. O Escritor esteve sempre ligado ao Partido Comunista Português. Foi um Homem determinado, de convicções fortes e inabaláveis. Existem pessoas que passam pela vida sem deixarem qualquer marca. Existem outras que pelo seu percurso, perseverança e nobreza de carácter, se tornam inesquecíveis e um exemplo para as gerações futuras. Cabe a cada um de nós manter viva a sua memória. É na maturação das ideias e na capacidade de diálogo, no humanismo, na compaixão e na solidariedade, que se consegue congregar as Sociedades e direccioná-las no caminho da evolução humana, independentemente das ideologias ou das crenças religiosas. Tenho a profunda convicção de que Portugal perdeu um dos maiores insignes vultos da cultura literária portuguesa contemporânea. Tudo o que se possa dizer ou escrever sobre este trabalhador acérrimo da palavra, ficará sempre aquém do riquíssimo exemplo humano que nos legou através da sua Obra. Uma das melhores formas de o homenagearmos será, indubitavelmente, lê-la. Por último e o mais importante de tudo o que escrevi, são as palavras do Escritor, já em guisa de despedida antecipada, palavras que fazem parte do seu último livro, "Nenhuma Vida", que será lançado para assinalar os seus noventa anos, e que abordará diferentes temáticas e olhares sobre a sua vida e Obra. 

"Daqui me vou despedindo, pouco a pouco, lutando com a minha angústia e vencendo-a, dizendo um maravilhado adeus à água fresca do mar e dos rios onde nadei, ao perfume das flores e das crianças, e à beleza das mulheres. Um cravo vermelho e a bandeira do meu Partido hão-de acompanhar-me e tudo será luar." 



Autora do texto: Isabel Vilaverde.

17 de Setembro de 2013
(@Todos os Direitos Reservados). 

Foto: Obtida através do Google.





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