segunda-feira, 26 de abril de 2010

NAS PLANÍCIES DO TEU CORPO


Nas planícies do teu corpo
Entrego o desejo feito seara ao vento,
E este braseiro do Sol
Que me consome, lento...
E esta chama inglória
Que rompe meu peito,
Traz-me a memória
De um sonho por cumprir...
Rendo-me aos teus beijos,
E as mãos tocam-se como sedas
Num fogo aceso...
Incendeiam-se os lábios
Sensuais e quentes como Estio,
E as bocas, loucas,
Atravessam pontes em desvario...
E navego... navego mar dentro,
Balançando nas ondas de ternura
Que os teus braços me oferecem,
Depois, deito o corpo na noite escura,
Em lençóis de alva brancura,
E os meus olhos humedecem...
Rasgo sorrisos e solto gestos
Que te aninham no meu corpo
Feito brisa...
E as palavras que dizemos, amor,
São já um vaivém de dor e despedida,
Um cais de encontro e de partida...
Nas planícies do teu corpo,
Entrego o sonho de amar-te
Mais do que a própria vida!

Written by: Isabel Vilaverde
Abril de 2010

domingo, 25 de abril de 2010

NAS ASAS DO VENTO


Espero-te todos os dias,
Como as manhãs esperam o Sol,
O dia morre...
E tu não vens para me abraçar.
Desejo-te todas as horas,
Como pássaro livre voando
Nas asas do vento,
Dentro de mim, lento,
O tempo morre...
E tu não vens para me beijar.
Imagino-te dançando
Sobre o meu corpo, ao luar,
Carente das tuas mãos,
A noite morre...
E tu não vens para me amar.
Esmorece o céu de estrelas,
E o dia rompe de novo
No silêncio da tua voz,
O grito morre...
E tu não vens para me escutar.
Procuro nos teus olhos,
O doce olhar nos meus,
As pálpebras descem devagar,
O olhar morre...
E tu não vens... tu nunca vens...
Deserta a alma para te encontrar.

Written by: Isabel Vilaverde
Abril 2010

terça-feira, 13 de abril de 2010

AMAR


Porque nunca estás aqui
Quando te desejo?
Espero-te... sem nada esperar,
Dou-te beijos longos e húmidos
Sem nunca te tocar...
E percorro-te lentamente,
Abraço-te carinhosamente,
Sem nunca te abraçar...
Deito-me devagar
Sobre o teu corpo,
Fundo o meu querer
Na conjugação do verbo amar...
Eu amo... tu amas... nós amamo-nos...
A tua pele sabe-me a sal,
Os teus lábios a mel,
E a tua voz, melodia ímpar,
Provoca-me arrepios
Como abismos que quero visitar...
Agarra ternamente
Os meus cabelos longos e negros,
Cinge-me com doçura a cintura...
Abraça-me na tua teia,
Prende-me na tua insarável loucura...
Ama-me sem pudor,
Escreve em mim a palavra amor.
Sente o meu respirar
Escuta o bater do meu coração,
Neste gemido liberto,
Nesta dança de corpos feita sedução,
Canta comigo, amor, os versos da mesma canção.


Written by: Isabel Vilaverde
Abril de 2010


DEIXEM-ME CHORAR


Os desejos podem transmutar-se,
Os sentimentos iludirem-se,
E a vida acabar sem ter sido vivida...
Sons da minha mente dispersos e eu só...
Imagens que quero reviver,
E a solidão fecha-me neste entardecer...
Resta-me o silêncio, a quietude das montanhas, a força do mar,
Às vezes abismo difícil de transpor...
No "eu" mais íntimo de mim...
Deixem-me chorar.

Written by: Isabel Vilaverde
Abril 2010

sexta-feira, 9 de abril de 2010

DELIRIUM


Um barulho de folhagem,
Um eco que me assusta...
E o frio fininho que corta a respiração...
Vagueio, vestida luar, por entre sombras
Deste jardim imerso feito amor,
Silêncios, beijos por dar... os passos lentos,
Deitam o corpo na solidão das horas,
À espera dos teus carinhos...
Braços nus, à espera de abraçar,
Percorro, olhar triste, caminhos,
Navego mares de ausência num barco feito desejo,
E este gemido constante que a noite traz,
Lembrança fugaz que a alma fere,
Quero amar-te como louca,
Segredar-te palavras de amor e paixão,
Beber esses beijos do cálice da tua boca,
E guardá-los todos no coração,
Possui-me, faz-me tua, como a noite as estrelas,
Como todas as sombras se entregam à Lua,
Desenha, em meu corpo, as ondas do mar,
Entrega-me o teu delírio,  faz-me delirar...
Declama, em meu peito, os versos puros
Que um dia o teu amor escreveu,
Prometo guardá-los como tesouros,
Deste amor, nosso, que do querer nasceu.

Written by: Isabel Vilaverde
Abril 2010

segunda-feira, 5 de abril de 2010

MOMENTOS


Sinto a noite como uma flecha
Que rasga a carne...
Percorro-te o corpo para me encontrar,
E beijo-te, amante, os lábios púrpura
Sinto a paz o meu ser inundar...
Idolatro-te na tela,
Pinto-te, a céu aberto, a beleza,
Evoco-te nas cores que me lembram
A tua singeleza...
Como a luz difusa que se espalha
E me mostra todo o teu esplendor,
O meu sonho transformas em amor...
Deixa-me amar-te todos os dias,
Para mim não há cansaços...
Há apenas o sentir e doces melodias...
E somente momentos e abraços.

Written by: Isabel Vilaverde
Abril 2010

domingo, 4 de abril de 2010

LAPSUS MEMORIAE


     Mercês acordou e olhou a janela desprovida de cortinas. Lentamente, levou as mãos ao rosto, sentindo os raios-do-sol acariciarem-lhe a pele. Por instantes, ficou confusa... era bom o que sentia, vinha de fora... atravessava os vidros.
- Alice, Alice, vem cá! Toca o meu rosto...
- Mãe querida, são os raios-do-sol... o sol é quente. Vamos levantar, eu ajudo-a.
- Desculpa, mas quem és? Não te conheço...
- Oh mãe, sou a sua filha. Ainda há pouco me chamou Alice, eu vim, mas não sou Alice, sou Maria.
- Alice, Maria... como gosto desse nome, e eu, como me chamo?
- Mãe, chama-se Mercês. Então já não se lembra do seu nome?
     Todos estamos expostos a uma situação destas, a perda da memória. A doença de Alzheimer, progressiva e irreversível, que nos pode transformar em vegetais, fechar-nos num gueto, roubar-nos a identidade, o nosso passado, o nosso presente. A memória, o que nos torna tristes ou contentes, o que nos permite perceber quem somos, o que fomos, quem amámos, quem desejámos. Tudo o que vivemos, todas as emoções, os momentos de angústia, de sofrimento, mas também os momentos de felicidade. A memória, que nos relembra o nosso primeiro beijo, dado às escondidas... As pequenas mentiras que dissemos aos nossos pais, por paixão, talvez... O nosso primeiro encontro ou o conto de fadas que vivemos, no dia que dissemos, sim, àquele que idealizámos ter ao nosso lado, para a vida inteira.
A memória da nossa primeira viagem, de barco ou de avião... ou o momento de exaltação, de profunda alegria, de êxtase, ao acariciarmos, pela primeira vez, um filho nosso ao nascer... As lágrimas choradas, de revolta e angústia, pela perda de alguém que muito amámos. A memória dos nossos amigos, daqueles que nos acompanharam ao longo do nosso percurso de vida. Tudo o que fomos, resume-se agora a um olhar estagnado no tempo, ao tempo que não sabemos sequer o que é... Os rostos dos nossos entes queridos que já nem reconhecemos. Os cheiros, os risos, as cumplicidades que já não partilhamos. Ficámos reféns de uma doença que nos roubou o nosso "eu", atirou-nos para o mais profundo dos abismos e legou-nos uma única certeza: a certeza de que o futuro não existe, e o presente é apenas a "memória" do que já não somos.

Autora: Isabel Vilaverde
Abril de 2010

sexta-feira, 2 de abril de 2010

POST MORTEM


Procuro encontrar-me
No tortuoso labirinto de mim,
Estranhamente pereço
Neste desencontro sem fim,
Imortal, Minh' alma deixa o corpo, sôfrego de amor,
Eleva-se, no infinito liberto desta dor que o consumiu aqui,
Na terra dos seres tristes,
Na terra da ausência e da agonia,
Das guerras e da tirania,
E vai, esplendorosa, finalmente,
Ao encontro do amor diáfano e eterno.
Parte para onde não há medo,
Nem lucros ou perdas, nem mentiras ou invejas,
E lá, no paraíso das almas onde não há diferenças,
Há apenas rios de amor para navegar,
Jardins com árvores de sonhos para desfrutar,
Flores, cores, pássaros a voar...
Casas alvas feitas de luz,
E estrelas brilhantes, feitas de beijos e perdão,
Como o Amor de Jesus.

Written by: Isabel Vilaverde
2 de Abril 2010
 
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