quinta-feira, 8 de julho de 2010

PORQUE NUNCA ME AMASTE?


      Porque nunca me amaste? Esta seria a pergunta que, se tivesse coragem, te faria. Passaram muitos anos, vinte e nove anos de uma vida, a minha, sem nunca saber sequer o que é sentir um beijo teu. Ano após ano, sem olhar o teu rosto, sentir o teu cheiro, esconder-me nos teus braços, sentar-me no teu colo ou simplesmente brincar contigo.

      Não sei como são os teus olhos, a cor dos teus cabelos, o teu sorriso. Não sei como és... Dizem que sou parecido contigo, não sei. Todos os anos há Natal e aniversários. Todos os anos há o "Dia do Pai". Todos os anos, até agora, nunca houve nenhum desses dias para mim, ao teu lado. Sei que vives perto, mas sempre longe... Sei que nunca me quiseste. Sei que me rejeitaste ao nascer ou melhor, que me abandonaste à minha sorte mesmo antes de eu nascer! Porquê? É tão difícil assim amar uma criança? Não sei se alguma vez te perguntaste porque o fizeste. Se foste capaz. Sei, apenas, que nos perdemos um do outro neste espaço, neste tempo que poderia ter sido de amor, de cumplicidade e de partilha, entre pai e filho. Decerto, sentir-me-ia mais feliz. Aliás, devo confessar-te que não sou feliz, não sei o que é ser feliz e penso que  não o sejas também, és? Vivermos a vida pela metade, só pode trazer dor e sofrimento. Hoje, a minha realidade é um cúmulo de dúvidas, de incertezas, de medos e desconfianças, porque nunca pude,  uma única vez dizer, a olhar para ti:  "Feliz Natal", "Parabéns pelo teu Aniversário" ou "Feliz Dia do Pai, amo-te". Comprometeste o teu e o meu futuro. A tua e a minha vida ficaram mais pobres. O meu sofrimento é permanente. Não sei se sabes o que é sofrer. Talvez, nesta indecisão que me tem acompanhado, a par com esta angústia, ganhe um dia coragem para, em vez de te escrever, ir ao teu encontro. Nada é permanente e imutável. Todos somos o que conseguimos construir ao longo da vida. Não devemos ter vergonha de cair. Todos erramos. Todos nos sentimos, em muitas alturas da vida, inseguros e frágeis. O mais importante é a coragem com que nos levantamos e olhamos o caminho à nossa frente. Tenho momentos que não sei se tenho forças para me levantar. Digo-te com toda a franqueza e reforço, afinal não me conheces. E, se nos cruzarmos na rua, não sabes quem eu sou. Mas devo dizer-te que eu sei. Sei onde moras, sei o café que frequentas, sei o carro que conduzes, sei como te vestes. Tudo faz parte da tua imagem exterior, não é? Aparentas, para os outros, ser um sujeito simpático. Mas, por dentro, não te conheço.
Não penses que ao escrever-te, estou a desculpar-te ou a perdoar-te. Não sei sequer o que sinto por ti... Vivo num abismo de incertezas e de perguntas por fazer. E se fosse ao teu encontro, como poderia saber a cor dos meus sentimentos? Entre nós corre um rio vazio de abraços... e de palavras.
Não consigo traduzir, nestas linhas, tudo o que me incomoda e dilacera por dentro. Provavelmente também não o conseguiria expressar, olhando para ti. A palavra, "Pai", existe apenas no meu imaginário, não a sinto. Nunca a digo. Nunca a disse. Devo dizer-te que gostaria de a ter dito, sempre, de lhe conhecer o significado.
      Talvez um dia decida ir ao teu encontro, sim. Talvez, nesse dia, encontre o teu lugar vazio. Não poderei, se assim for, olhar-te nos olhos e perguntar-te: porque me abandonaste? Também não poderás ver o meu olhar carregado de raiva e mágoa ou, frio e distante ou... não sei!
Se encontrar o teu lugar vazio... O que poderei esperar mais? Afinal as nossas vidas não têm sido sempre um desencontro?


Written by: Isabel Vilaverde
12 de Setembro 2009
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3 Comments
Luiz Says:
A descrição de abandono fere os olhos o coração, não faço perguntas porque essas nem tu as tens. Simplesmente pergunto a mim mesmo, como é possivel acontecer deixar para trás parte do nosso corpo sem ter remorsos?
Um texto cheio de lágrimas…um dia irás dizer-lhe “Feliz Natal”

July 7th, 2010

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Isabel Vilaverde

July 9th, 2010
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1 comentário:

  1. ...gostei do texto mas não consigo encontrar palavras para o comentar
    ...jinho doce

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